Nuno Santos faz duras criticas a Luís Filipe Vieira: "Está como a equipa, sem fio de jogo nem ideias claras"

Os que aqui andam há uns anos – seja no campo ou à volta dele, seja nos jornais ou na televisão – sabem perfeitamente que não há nada mais irracional do que o futebol. 

É uma atividade em que as decisões casuísticas, ou simplesmente tomadas por impulso, se sucedem e em que respeitáveis figuras, conhecidas pelo seu pragmatismo noutras áreas, dizem e fazem as coisas mais extraordinárias. 

Coisas que, convenhamos, julgávamos até impossíveis de acontecer. Isto é assim, e não faltam exemplos. O mais recente, e apesar de tudo chocante, é o do Benfica – em que, à qualidade titubeante do futebol, se soma uma inexplicável política de contratações e, acima de tudo isso (ou por causa de tudo isso), de atitudes de cabeça perdida e sucessivas declarações que mostram um clube à deriva.

A ver se nos entendemos: Luís Filipe Vieira tem todo o direito – e razões objetivas – para protestar contra a arbitragem do Benfica-Belenenses. Um olhar distanciado e absolutamente independente sobre aquilo que se passou na Luz, no último fim de semana, facilmente deteta os motivos da ira de Vieira. E de Jesus. E da esmagadora maioria dos adeptos encarnados. 

O presidente do Benfica fez o que fez, e, como está dito, há razões para isso. Mas fazê-lo no final do jogo, a quente, e insinuando o que não pode provar só desgasta a instituição e o seu líder. Se somarmos a isto a entrevista dada, faz agora uma semana à CMTV e ao Record, em que anunciou a candidatura à Champions e alijou as suas próprias responsabilidades, dizendo que o Benfica tinha o melhor plantel dos últimos 30 anos, verificamos que Vieira está como a equipa – sem fio de jogo nem ideias claras. 

Esta última declaração, aliás, está em linha com a afirmação no final da época passada, em que disse não poder ser responsabilizado pelos resultados do futebol. Como se isso fosse possível. Ou aceitável.

Se quisermos ir por aí, então qualquer dia será preciso fazer a pergunta: se Luís Filipe Vieira não é responsável pelo cumprimento – ou melhor, pelo incumprimento – dos objetivos desportivos, então é responsável por quê? Pelas contas? É que aí, ao que parece, também não há boas notícias para dar.

O Benfica tem um problema e não vale a pena tentar camuflá-lo: o plantel é bom (indiscutivelmente), o treinador é bom (indiscutivelmente), mas esse valor não está a ter tradução no relvado. Nesta temporada – e já lá vão sete jogos oficiais –, ainda não se viu uma exibição que merecesse nota claramente satisfatória. 

Derrota na Madeira, vitória arrancada a ferros em casa, frente ao Gil Vicente, empate murcho em Alvalade, estes 90 minutos medíocres com o Belenenses, etc. Acrescente-se a tudo isto o patético dossiê Oscar Cardozo e as vendas que ficaram por realizar no mercado (é por isso, aliás, que o plantel é tão bom...), e assim talvez se perceba melhor o nervosismo de Vieira. E, claro, mais dois “pormenores”: o 5.º lugar na Liga e os 5 pontos de atraso para o FCPorto.

-Nuno Santos, jornal Record, 1 de Outubro 2013