sábado, 28 de setembro de 2013

Rui Santos: Jesus, a "bomba relógio" tinha de rebentar


O protagonismo (negativo) que Jorge Jesus conheceu em Guimarães poderia ter acontecido noutro jogo, noutra cidade ou mesmo noutra ocasião. Poderia ter envolvido, até, outros agentes desportivos. Mas sentia-se que estava na iminência de acontecer. Isto para dizer que a “estrutura do Benfica” (ou a falta dela) também é responsável pelo que aconteceu. Estava na cara que, depois do caso Cardozo e depois de tantas indefinições que expuseram o treinador, Jorge Jesus (qual bomba-relógio) tinha de “rebentar”. Aconteceu em Guimarães, porque os antecedentes e as circunstâncias do próprio jogo (rasgadinho, duro, emotivo) determinaram que fosse ali...

Não conheço muitos treinadores portugueses que evidenciem a paixão e a determinação que Jorge Jesus coloca no exercício da sua actividade. É um homem convicto, que acredita no seu saber técnico-desportivo (e, por isso, também táctico) para ultrapassar as questões colocadas pelos adversários e oficiais do mesmo ofício. Amante da escola holandesa, não despreza a exigência no treino como a alavanca que permite exteriorizar a exigência na competição, estudo a fundo os antagonistas, individual e colectivamente, e não é por acaso que a equipa do Benfica revela um menu considerável de jogadas ensaiadas de bola parada, o que prova trabalho, critério e criatividade na busca de soluções que possam gerar desequilíbrios e golos.

É evidente que qualquer treinador, nos dias de hoje, tem de se preocupar em tentar antecipar o jogo – um jogo que nunca é igual – e, nessa conformidade, vê-se obrigado a investir naquilo que são as dinâmicas individuais para se conseguir um bom desempenho colectivo. Só que alguns não levam essa “especialização” ao limite e Jorge Jesus é obcecado naquilo a que se pode denominar a “robotização do jogador”. Eles têm de ser suficientemente mecânicos, na cobertura, nas saídas de bola, no passe, na desmarcação, na compensação e no pressing sobre o adversário e a bola.

Contudo, como acontece com a generalidade da raça humana, Jorge Jesus tem as suas limitações e condicionantes. Às vezes fala-se de plantéis equilibrados ou desequilibrados. Também se pode falar de treinadores equilibrados e desequilibrados. Jorge Jesus é um treinador desequilibrado. Muito bom no treino e em competição. Menos bom na comunicação e no domínio de outras variáveis que são essenciais num técnico de futebol de uma equipa chamada grande. E quando, como foi o caso na época passada, os objectivos não são alcançados, como quase estiveram a ser, as críticas (externas e internas) crescem a um ritmo exponencial, a pressão aumenta e ainda quando os problemas se avolumam (indefinição na constituição do plantel, caso Cardozo, etc.) não é fácil manter o controlo emocional.

O que aconteceu em Guimarães foi o efeito que se pode comparar a uma panela de pressão. Depois de uma vitória difícil, num jogo em que o Vitória colocou tudo o que tinha para colocar em campo, o episódio à volta dos adeptos resultou, para Jorge Jesus, como o grande momento da descompressão, alavancado pelos antecedentes, até no que diz respeito à relação que entretanto se estabelecera com esses mesmos adeptos. Não tenhamos dúvidas que a má condução do caso Cardozo repercutiu-se em Guimarães. Jorge Jesus teve de passar pela provação de ouvir o Estádio da Luz (com a massa associativa dividida) a chamar por Cardozo, o jogador que o havia desconsiderado brutalmente na final da Taça de Portugal. O Benfica, em cinco anos, não percebeu o treinador que tem, não percebeu, no momento em que tinha de perceber, a dimensão do caso Cardozo, e nisso Luís Filipe Vieira é o maior culpado.

Tudo o resto é lamentável. A ausência de inquérito por parte do CD da FPF, a absoluta demissão de responsabilidades por parte dos delegados da Liga, a postura de negar as evidências. O futebol tem de contar com gente independente, fria nas análises, capaz de fazer cumprir as regras. Se não for assim, o futebol continuará entregue às clientelas clubísticas, que a todos querem controlar, dominar, condicionar. E a esvair-se na sua fraca credibilidade...

Oassunto vai agora conhecer o seu período de adormecimento e talvez se conheçam as consequências da atitude irreflectida de Jorge Jesus na parte final da época ou mesmo em 2014/15...

NOTA – O que ocorreu em Guimarães e na Amoreira deu para camuflar os problemas sentidos pelo Benfica e FC Porto nos respectivos jogos e outro tipo de tensões. A guerra Norte-Sul está muito longe de conhecer o seu epílogo. Um administrador de uma SAD que dá uma palmada ou um empurrão num presidente de uma associação de futebol ou está perturbado ou não tem educação. Ou... ambas as coisas.

-Rui Santos, jornal Record

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