O silêncio impera à volta do adiamento do V. Setúbal-FC Porto, de 14 de Dezembro para 23 de Janeiro.
Lêem-se e relêem-se os regulamentos e não se consegue encontrar motivo para que o jogo não se tivesse realizado nas 30 horas seguintes, segundo preceitua o Artigo 22 do Regulamento de Competições.
Só havia duas excepções possíveis à regra das 30 horas: um jogo da UEFA na semana a seguir, o que não era o caso; ter ficado registada no boletim do jogo a data de 23 de Janeiro, o que ainda ninguém confirmou.
Se também não foi este o caso, então a partida ter-se-ia de cumprir "no decurso das 4 semanas a seguir", como refere o artigo 19 do mesmo Regulamento de Competições, salvo "caso de força maior" a ser validado pela Comissão Executiva da Liga.
A Liga marcou o jogo para 23 de Janeiro sem qualquer explicação, mas parece óbvio que não estamos perante "um caso de força maior".
O adiamento do V. Setúbal-FC Porto é que encerra, dentro de si, um caso de força maior. Quantos jogos já se realizaram em Portugal nas condições oferecidas, na noite de 14 de Dezembro, pelo relvado do Bonfim?
Pedro Proença achou que não, estimulado certamente pela falta de vontade de ambas as equipas em realizar o encontro. Ficou na retina o gesto ridículo de Pedro Proença em deixar cair a bola na vertical em cima de uma poça de água.
É fácil de perceber que Pedro Proença nunca teria decidido em sentido contrário à vontade dos contendores, por muitas poças que o relvado exibisse. Os árbitros sabem que não têm condições de revelar independência e acabam por ter de lidar com as circunstâncias, com maior ou menor valorização do... Apito Dourado.
Estava Pedro Proença em tempo de fazer a aproxímação ao Benfica (depois de ter sido "vetado" por Luís Filipe Vieira na época passada), sem provocar a ira do FC Porto.
A verdade é que "o melhor árbitro português" não foi nomeado e os "prémios de carreira" continuam a ser atribuídos em momentos de grande responsabilidade.
João Ferreira foi um dos protagonistas do célebre jogo do "túnel da Luz" (Hulk, Sapunaru...) e ficou muito conotado, a partir daí, com o Benfica...
Os responsáveis do FC Porto não quiseram correr riscos antes do clássico e, com um plantel mais curto, preferiram o adiamento do jogo com os sadinos.
Tudo se esfumará se o FC Porto vencer na Luz, mas o assunto virá à baila se o resultado amanhã for adverso aos azuis e brancos. Porque, à partida, entrar na Luz com menos 3 pontos (e menos um jogo) não coloca nenhuma pressão suplementar ao Benfica, e já se viu que o FC Porto normalmente reage melhor quando o clima, aparentemente, se lhe torna hostil.
É verdade que desta vez até foi o treinador, Vítor Pereira, a lançar a provocaçãozinha da ordem ("O Benfica está sempre em grande forma, mas o FC Porto acaba por impor o seu jogo e ganhar"), mas os encarnados já não caem na esparrela como em tempos não muito distantes.
Está, pois, por apurar a validade da estratégia do FC Porto em criar as condições para o adiamento do jogo do Bonfim para o próximo dia 23. E está também por apurar se o silêncio, até agora, dos responsáveis benfiquistas tem (ou não) um sentido estratégico, considerando a proximidade do clássico.
Se não tiver esse sentido estratégico e se o FC Porto voltar a ganhar na Luz, Luís Filipe Vieira vai ter de explicar aos sócios e adeptos do Benfica a razão pela qual deixou passar a aparente ultrapassagem aos regulamentos no caso do adiamento do V. Setúbal-FC Porto.
É que, juridicamente, se se confirmar que a data de 23 de Janeiro não foi escrita no boletim de jogo como a data acordada entre o V. Setúbal e o FC Porto para a realização do jogo não efectuado em 14 de Dezembro, haveria motivos para construir a tese em redor da "falta de comparência"... com a consequente perda de pontos.
O Benfica vai salvaguardar os seus interesses e jogar sob protesto?
Até que ponto o risco de criar um foco de tensão supletivo vai impedir Luís Filipe Vieira de cumprir a obrigação de defender os interesses do clube a que preside? Ou será que... o "sistema" já não existe?!»
- Rui Santos, jornal Record, 12 de Janeiro de 2013