João Querido Manha: Circo Jesus

Com a nação encarnada em estado de choque, a confusa comunicação do Benfica não teve mãos a medir em indícios, sugestões e pistas, ao mesmo tempo que bloqueava quem podia enterrar de vez o ano horrível e fazer nascer uma nova e venturosa época, o treinador Jorge Jesus.

Diz que fica mais dois anos, como se fosse possível prolongar para lá de alguns meses a longa ausência de vitórias. Diz que aceitou ficar com o velho ordenado, como se ele não estivesse já agravado pela repetida falha de objetivos desportivos. Diz que impôs uma remodelação dos gabinetes, como se fosse dos dirigentes a responsabilidade pelas oscilações físicas e mentais dos jogadores.

Não só Jesus foi surripiado aos previstos banhos mediáticos preparados pelo seu mentor filosófico, ficando por esclarecer cientificamente o colapso da equipa a partir do momento em que decidiu interromper o processo de rotatividade do plantel, como Cardozo, um dos ativos mais valiosos, foi mantido na fogueira sem poder justificar-se publicamente pelo incidente viral que protagonizou no final da transmissão do Jamor, 50 vezes mais repetido do que o histórico golo de Ricardo.

Já uma vez um treinador se atreveu a dizer que o Benfica é um Circo, com os seus malabaristas, equilibristas, domadores de leões e, seguramente, alguns palhaços, sem ofensa. Jorge Jesus transformou um espetáculo decadente e de barraca às costas numa espécie de Cirque du Soleil moderno, plástico e emocionante, fez os benfiquistas sonhar e vibrar todas as semanas. 

O cartaz para o próximo ano já está escolhido e em fase de organização, pelo que é impossível perceber o que se pretende com o prolongamento deste tabu, que remete para as palhaçadas da política.

Na estratégia de comunicação do Benfica, Jesus é tudo, mas não é nada. A ideia seria fazer crescer a aura do grande líder, a um nível de poder que se confunde com aquele presidente de quem muitos adeptos esperam que demita o primeiro-ministro.» 

- João Querido Manha, jornal Record, 2 de Junho de 2013