sexta-feira, 12 de abril de 2013

João Bonzinho elogia o atrevimento das substituições de Jesus em Newcastle



Como foi enorme, ontem, o coração da equipa do Newcastle, motivada por uma fantástica tribo de adeptos, genuínos adeptos como só os ingleses sabem verdadeiramente ser, e como foi sofrida, desnecessariamente mas sofrida, a noite europeia das águias, que têm jogadores e equipa com suficiente qualidade para não ter de passar o que passou no jogo de St. James' Park. 

Bastou os encarnados oferecerem aquele golo ao adversário para que o jogo se transformasse no que não tinha sido até aí. Domínio dos negros-e-brancos, impressionante coração de Cissé e companhia, e os homens de Jesus a viver momentos de autêntica dificuldade, ainda que, espremido o jogo, sem grandes oportunidades de novo golo para os da casa. 


Confirmou-se: St. James' Park consegue levar a sua equipa ao colo e dá-lhe força suplementar, mas, no fim, confirmou-se também que o Benfica tem categoria e qualidade para discutir na Liga Europa a final e, quem sabe, o título, que em 2011 sorriu, com todo o mérito, ao FC Porto então de André Vilas Boas.

No belo pano encarnado, a nódoa foi, ontem, aquele golo oferecido pelo argentino Garay, sobretudo por Garay, que estava de frente para a bola e para o adversário e ficou à espera que fosse Matic, o pobre Matic, a resolver o que não lhe competia resolver. 

Como não resolveu Matic e tão descaradamente facilitou Garay, o Newcastle incendiou o jogo. Como diz, sabiamente, o povo, no melhor pano cai a nódoa, e a verdade é que, com maior ou menor culpa, foram afinal dois extraordinários jogadores (dos melhores deste Benfica de Jesus) a abrir caminho para o perigoso golo da equipa inglesa, que levou o despique para uma diabólica e escaldante parte final, apenas travada, já ao cair do espetáculo, por mais um cirúrgico e oportunista golo do temível Salvio.

Tivesse Nico Gaitán a eficácia do compatriota e um bocadinho mais da raça do companheiro do flanco contrário e talvez o Benfica não tivesse sofrido um décimo do que sofreu na noite europeia de ontem para conseguir sair da nortenha e cinzenta cidade inglesa com o bilhete da meia-final no bolso. 

Já se sabe que o pano do Benfica é bom e que esta época a equipa e o treinador têm mostrado maturidade superior à dos dois anos anteriores, o que lhe permite, quase a meio de Abril, ser líder da Liga, estar, já nas meias-finais da prova europeia e com pé e meio na final da Taça de Portugal.

Vê-se, até agora, um Benfica muito mais equilibrado e sobretudo muito mais consistente, regular, forte e eficaz, ofensivamente poderoso e defensivamente cauteloso e trabalhador, e vê-se um treinador que, mantendo toda a intensa paixão e influência no futebol da equipa, se mostra mais sereno, perspicaz e racional. Bom exemplo o de ontem, quando se viu Jesus, na fase de maior aperto, resistir à decisão «mais normal» mas provavelmente imprudente, de trocar um avançado por um defesa (Ola John por Jardel, por exemplo), dando o peito às balas com a colocação em campo, muito mais oportuna, de dois avançados - Cardozo e Rodrigo - no lugar de outros dois - Lima e Ola John - mesmo depois de o Newcastle chegar ao golo sonhador.

Foi «de homem», como dirão os mais apaixonados adeptos benfiquistas. Foi decisivo, digo eu. Mas se o pano encarnado é decididamente bom, cuidado com as nódoas, com as desconcentrações, com as distrações, com a euforia, com o excesso de entusiasmo. Ontem, naquela fase gritante de vinte minutos de sofrimento, um segundo golo do Newcastle teria certamente arrumado com os benfiquistas e logo voltaria, aposto, o fantasma das duas últimas épocas de ver a equipa da Luz... morrer na praia.

Quer isso dizer que a consciência dos riscos deve exigir ao Benfica um cada vez maior sentido de responsabilidade, um maior espírito de sacrifício, maior determinação e maior raça. Por um período do jogo de ontem, o Benfica pareceu oscilar entre a entrega e a displicência. No futebol, como bem se sabe, a fronteira entre as duas é, por vezes, mais fina do que uma lâmina.

PS: Benfica e Jesus ainda não anunciaram se o futuro de ambos continuará a ser partilhado e a ter objetivos comuns. Verdadeiramente, nem se sabe em que ponto está o espírito de clube (leia-se presidente) e treinador. Mantenho apenas o que já aqui deixei expresso: aconteça o que acontecer, o Benfica devia renovar com Jesus. Se fosse eu, seria por dez anos!» 

- João Bonzinho, jornal A Bola, 12 de Abril de 2013

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