Fernando Guerra arrasador com Jorge Jesus: Projecto de Vieira com Jesus é uma ilusão

Há três anos, a seguir a ter ganho o único campeonato no consulado de Jesus, ainda os foguetes estrelejavam e já o Benfica acusava irremediável atraso na classificação apenas com quatro jornadas realizadas (nove pontos). Acabou a 21 de distância do FC Porto e... nada aconteceu, porque havia um projeto.

Hoje, depois de tudo ter perdido na temporada anterior, verifica-se ligeira melhoria na medida em que, à mesma quarta jornada, no pior dos cenários a diferença para o rival nortenho estanca nos oito pontos. Embora com simpáticas perspetivas de se manter nos atuais cinco ou até menos, o que será um passo em frente na consecução de tal projeto que, sem rodeios de linguagem, pretende devolver ao emblema da águia as conquistas desportivas que o promoveram a clube do mundo. 

A intenção é boa, corre é o risco de ser só isso enquanto, como em todos os projetos, não se corrigir o que tem de ser corrigido e não se mudar o que deve ser mudado.

Sobre o assunto, defendo uma posição, antes expressa diversas vezes, que vale tanto como a de qualquer leitor que fizer o favor de me ler: Jorge Jesus devia ter sido substituído imediatamente a seguir ao título nacional em 2010, por se ter esgotado naquele momento o espaço de intervenção em que se tem destacado ao longo da sua carreira, o chamado efeito de choque, peculiar ao nível da motivação do relacionamento e do diálogo, mas por período necessariamente curto. 

Assim que é recuperada a estabilidade, Jesus desaparece em consequência daquilo que julgo ser uma evidência: a sua dificuldade em enquadrar-se numa lógica de continuidade.

Vieira está convencido do contrário, acredita num projeto com Jesus, como declarou em recente entrevista à Benfica TV. O problema é que esse projeto é uma ilusão. 

Existe, sim, mas não com Jesus, embora o presidente benfiquista insista em tentar demonstrar o contrário. Está no seu direito, claro que o deve fazer, atrevendo-me eu, porém, a sugerir-lhe avaliação prévia dos custos de semelhante obstinação, a começar pelo inacreditável vencimento do próprio treinador, passando pelo esforço financeiro que tem sido dirigido para o futebol e pela excelente política de aquisições que conduziu à formação de plantéis de enorme qualidade. 

O deste ano, então, é impressionante, mesmo amputado de laterais à altura e ferido por aquele desequilibrado modelo tático de loucas correrias, sem posse nem circulação de bola e castrado na capacidade de pensar o jogo... no jogo.

Ninguém pode acusar Luís Filipe Vieira de não ter dado tudo o que é preciso para se alcançar o sucesso no futebol: condições de trabalho invulgares, contas em dia, praticantes de imenso valor. Nada falta, a não ser vitórias e títulos. 

Julgo que Jesus esbanjou oportunidades que todos os colegas de profissão desejariam e... nunca vão desfrutar. De falhanço em falhanço, tem revelado a sua impreparação para níveis de exigência competitiva tão elevados. 

Apesar disso, o castigo sofrido foi a renovação de contrato em obediência ao tal projeto disfarçado de sonho... até à derrota final, quando o divórcio se tornar inadiável. De aí que o despertar para a realidade se preveja doloroso. Como foi isto possível?...

Tento compreender a angústia de Vieira, o chamado sofrer para dentro, ao ver a sua prendada e mimada equipa ser humilhada na final da Taça de Portugal por um Vitória de Guimarães competente, cercado por graves dificuldades e a contar os cêntimos para sobreviver com dignidade. 

Naquele instante, acredito que o presidente benfiquista bateu no fundo do poço: e agora?, ter-se-á interrogado. 

Desistir, nunca! Outra dose de ânimo, coragem, sacrifício e investimento: eis o fantástico plantel do Benfica! 

Jesus está obrigado a ser campeão, digo eu, à custa de demasiado dinheiro. Há por aí gente bem mais em conta, com ideias mais interessantes e mais capazes. 

Que percebe depressa as diferenças entre o que é trabalhar num clube que luta pelo quinto lugar e noutro para quem o segundo já significa derrota. Jorge Jesus vai para a quinta época na Luz e continua a assobiar para o lado: pensa estar acima da instituição que principescamente lhe paga. Estranho, não é?...

- Fernando Guerra, jornal A Bola, 10 de Setembro de 2013