Por muito esforço que alguns tenham feito e vão continuar a fazer no jogo das palavras, o último dérbi terá um lugar na história e não será por causa dos erros de arbitragem, por mais graves que tenham sido. Será para sempre o dérbi de Rui Patrício, por causa de um lance invulgar, altamente penalizador, a partir de uma falha de concentração, depois de quase duas horas de extrema intensidade e pressão.
Parafraseando o presidente do Sporting, é realmente uma enorme palermice tentar desfocar a ordem de importância dos fatores decisivos deste jogo inesquecível, a saber: primeiro, o erro de Patrício, depois, os três golos de Cardozo e, finalmente, o imbróglio em torno da verdade desportiva. É assim que a história reserva um espaço para este embate, digno de uma final, mas disputado numa fase tão precoce da Taça de Portugal. Nenhum penálti por assinalar tem o valor simbólico de um golo sofrido por entre as pernas de um guarda-redes e esta imagem colar-se-lhe-á à pele e ao currículo para sempre. E daí?
Quem conhece minimamente a história do futebol nacional saberá o valor e a influência que, Costa Pereira teve na grandeza do Benfica (e da Seleção Nacional) dos anos 60. Foi um grande, mas sempre num patamar abaixo dos Damas e dos Bentos, por causa de um golo sofrido assim, numa bola pífia, por baixo das pernas, na final de Milão. A história é o homem e a sua circunstância, não há escapatória.
Muitos sportinguistas insurgiram-se ontem contra o relevo dado pelo Record ao momento do jogo, uma extraordinária foto de Paulo Calado, chegando alguns a alegar a falta de patriotismo dos editores, tendo em atenção o próximo jogo da Seleção. Muitos benfiquistas, pelo contrário, consideraram muito frouxa a opção de deixar de fora do léxico garrafal o "frango" e o "peru" que estiveram nas mesas de tantas conversas de domingo.
Rui Patrício ainda vai a meio de uma carreira que teve um início fulgurante, mas tem vindo a estagnar pela dificuldade em conquistar títulos, mantendo-se no topo da confiança do selecionador, mas ultrapassado sistematicamente nas escolhas dos grandes clubes europeus.
O moral da história do dérbi, à face desta incontornável situação, é que os erros dos guarda-redes, que são muito raros e, por isso, iconográficos, têm custos pessoais incomparavelmente mais graves que os dos árbitros, que são banais.
- João Querido Manha, jornal Record, 11 de Novembro de 2013
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